quarta-feira, agosto 11, 2010

Zunido filosófico

- Olá, Abelha!
- Bzzzzz! Bzzzzz! Bzzzzz!

- Pareces dormir.
- Bzzzzz!Bzzzzz!Bzzzzz!

- Ou talvez não.
-Bzzzzz!Bzzzzz!Bzzzzz!

- Mais de três anos sem te ver...
- Bzzzzz! Bzzzzz! Bzzzzz!

- Ocupado no mundo.
-Bzzz!Bzzz!Bzzz!

- Para o mel o prazer e o cansaço do voo. A colheita.
- Bzzzzz! Bzzzzz! Bzzzzz!

- O aroma. O polén.
-Bzzzz!Bzzzz!Bzzzzz!

- Olá, Abelha!
- Bzzzz!Bzzzz!Bzzzz! -ouvi finalmente.

quarta-feira, janeiro 03, 2007

Da má literatura. Da má vida.

A melhor literatura não usa palavras. Usa o sentido que está entre o que a palavra quer dizer e o que pode significar. Por isso é que escrever pdoe ser algo verdadeiramente detestável.

segunda-feira, agosto 14, 2006

Uma árvore





Um velho carvalho:
Manhãs de Maio à sombra
da sabedoria.

sexta-feira, julho 21, 2006

Aforismo

A velhice é a porta fechada da juventude.

sexta-feira, junho 30, 2006

Imaginário

Entro cedo na cidade antiga, a oriente deste verão. Velhas ruas inundadas de gente, a gente de sempre no burgo escasso, cerca do bazar. Oiço as vozes de uma língua estranha, e respiro um ar de paz, um ar vermelho, tórrido, amarelo. Quente de cheiros: açafrão, gengibre, soja. Um velho porto onde os barcos antigos, ancoram na água das pérolas. Arroz, chapéus de palha.
Na margem, um anciãode barba branca e longa, junto à ponte, abraça um peixe. Depois engole um pequeno dragão.

Fragmentos

Um homem caminha.
Avista o mar, as montanhas,
répteis sobre a terra.

Uma rua antiga. Uma rua de brincar. Atrás do jardim, do grande jardim das tílias fragrantes em tempo de quase-verão: uma bola, um pião, carros feitos de madeira e de rolamentos.


Jardim de tílias.
Gaiola a oriente,
das mãos e do voo.

sexta-feira, junho 16, 2006

Proletariado mediático

Viriato Soromenho Marques, a propósito do papel da televisão:

(...) "Na sua pior dimensão, a televisão é o meio preferencial da sociedade de mercado onde vivemos, uma sociedade onde não há nada que não seja mercadoria transaccionável. Nem a honra, a dignidade ou os valores. A televisão rima hoje com poder. Seja ele político ou económico.
(...) A tendência é para que os canais generalistas se transformem nume espécie de "panem et circenses" (pão e circo), modelando os gostos do que podemos designar como "proletariado mediático" (a maioria dos telespectadores) .
In O Diabo, 13 de Junho de 2006
Comentário:
Discordo. A honra não é uma mercadoria, nem a dignidade, nem os valores!!! Ainda que alguns os trasnsaccionem para iludir o "proletário dos media". Oh! Cruel conceito!!! Oh! cruel decadência! Há constatações demasiado perigosas.

Mensagem

Uma mensagem chega ao teu correio acompanhada de duas fotografias. Diz assim:

- Aqui seguem dois bons momentos:
Uns camarões asiáticos com arroz selvagem e puré de bróculos.
E a inauguração da púcaro de barro negro com uma maruca e batatinhas no forno.
Abraço e que o dia seja feliz pelo paço.

quarta-feira, junho 14, 2006

II

Olhar as nuvens
cinzas verdes e árvores
chão de água e de pó.

I

O voo do melro
pára no choupo verde
molhado, à chuva.

quarta-feira, junho 07, 2006

Da Juventude - Passagem das nuvens














Praias, cafés, apartamentos,
lugares onde, pela última vez, a pele foi tocada.

Um dia, com a mala por abrir,
um dos amantes regressará às ruínas da cidade,
e se não regressar,
num outro porto de abrigo,
sempre que uma viagem termine,
lembrar-se-á do breve vento de verão,
da janela e do quarto azul,
onde, como na tela transparente dos olhares,
havia lágrimas e alguns sorrisos.

Janeiro,1999.

Insónia

Grasnar da gaivota:
- Branco voo de estio
em noite profunda.

quarta-feira, maio 31, 2006

Fúnebre

Um engarrafamento na zona velha cidade. Aí as cores das fachadas dos prédios são pálidas e carcomidas. Em baixo, gaivotas e pombos de rua. Passeios sujos de calcário. Tabernas e cafés onde humanos embriagados se escondem. Um carro fúnebre transporta a urna e os familiares de preto.
À porta, um bêbado acena. Mostra os dentes podres, diz "adeus".
Tudo muito doméstico. Habitual.

segunda-feira, maio 22, 2006

Miséria

Quando o silêncio era uma vergonha, os corpos escondiam-se dos trapos. Havia pudor. Agora, na época do ruído, os corpos saem à rua. Expostos, caem aos pedaços. Não há vergonha. Entre um e outro tempo, mais do que a pobreza, a miséria humana de sempre.

quarta-feira, maio 17, 2006

Da vida efémera, da tristeza e da ignorância

Velocidade

Passar às árvores,
não saber coisas de árvores
por não querer vê-las.

terça-feira, maio 16, 2006

Dois Haikus Urbanos

I

Cães de casino
Quentes noites e secas
E homens a ladrar.

II

Mulheres de espuma
Um circo de lantejoulas
Vaginas de armazém.

quarta-feira, maio 03, 2006

Abelhudo e abelhudos. Subjectividades

Protesto inflamado.

Um apicultor sul-coreano salta para cima de uma bandeira japonesa e de uma imagem do primeiro-ministro Junichiro Koizumi, em Seul. Ahn Sang-kyu libertou 200 mil abelhas para protestar contra o facto de o Japão reclamar a soberania sobre os ilhéus sul-coreanos de Dokdo.



Foto: Lee Jin-man/AP

segunda-feira, abril 10, 2006

Desabafo

Tenho sede de férias. Se fosse possível ia para qualquer lado, até para a Conchinchina! Estou cansada, farta de tomar cenas para dormir. Chás, Valdisperte’s…Deixei de tomar café e não durmo. Há uma semana que ando a dormir três a quatro horas por noite e estou cansada. Ontem o meu irmão foi com o meu pai para as urgências, nem me chamaram. Só me disseram hoje de manhã.
Ele está bastante constipado e não pode tomar certas medicações por causa do fígado. É gripe. Foi muito abaixo. Depois trabalha por turnos à noite, apanha frio, não é grave mas agora está de baixa. Eu é que já não consigo separar o grave do menos grave. Acordei às oito horas com a minha mãe a dizer o que se tinha passado e fiquei fula por ninguém me ter dito nada. Devia ter ido lá jantar, mas não fui para estar com o Hugo. Também não valeu de nada. Zangámo-nos. Ando a perder o meu tempo com ele. Sinto-me mais frágil. Choro com mais facilidade e ele fica todo stressado com isso. Diz que não sabe o que fazer e não percebe que não tem de fazer nada. Só tem de me deixar chorar à vontade e ponto final. Ontem tive de pôr as coisas no plano do tudo ou nada, porque não há hipótese: ou ele aguenta que eu esteja com uma depressão e chore, seja em que circunstâncias for, ou porque passa uma música no rádio que me toca, ou porque me cai uma cagadela de pomba no casaco, ou então se não aguenta eu vou embora, porque ele cansa-me, as perguntas dele cansam-me, o ele querer fazer com que eu não0 esteja assim triste só me entristece ainda mais. O problema disto tudo é que eu tenho de trabalhar e ando com uma cara péssima, tenho de fazer telefonemas e como passo a vida fugir para ir chorar à casa de banho fico com a voz "presa". Depois vou à minha psicóloga e ela diz-me que eu estou no bom caminho para lidar com a depressão só porque me vê bem vestida e arranjada, porque, segundo ela, se eu estivesse mesmo mal não tinha vontade de me arranjar. Bolas! Claro que ando bem vestida, ao dinheiro que ando a gastar em roupa!!! Só estou bem dentro do shopping. Era o que mais faltava! Se para além de andar triste ainda andasse desmazelada! Tenho 28 anos. Sou bonita, tenho de andar bem vestida.

sexta-feira, abril 07, 2006

Harmonica e os Arruma Carros

O Harmonica que é Charles Bronson no Western Épico de Sergio Leone, "Once Upon a Time in The West" (1968), poderia encarnar. Apareceria em silêncio, saindo do nada tórrido do deserto, tocando a harmonica de Ennio Morricone pelas ruas secas, arenosas das cidades portuguesas, onde há jovens desgraçados, drogados, despedaçados, despenteados, mal-cheirosos, acenando em orquestra, para os lugares vazios de quem procura estacionamento.
Uma extorsão voluntária que as autoridades permitem. É inaceitável há mais de uma década!

O Harmonica faz falta na realidade deste "west".

Sonho

Agosto, 1993


Estudantes timorenses, numa acção que outros repetiram em datas anteriores, invadem e refugiam-se na embaixada holandesa em Jacarta. Dois deles: Abraão, cabelo comprido, magro moreno. Guerrilheiro aos nove anos nas montanhas de Loro Sae. Hélder, cabelo curto, óculos redondos, mais baixo e mais gordo. Comunista crítico de Suharto. Dias mais tarde, um avião da Cruz Vermelha transporta-os para Amesterdão, de onde saem rumo a Portugal. Ingressam na Universidade. Cursos: Sociologia e Administração Pública.
"É preciso ver mais longe", dizia Hélder; "...e cantar, cantar..." acrescentava Abraão, segurando a viola.
Abril, 2006
Abraão passeia de cabelos longos e brancos numa rua anónima, escura. Trabalha no norte da Europa, num aviário. Hélder, passa e não me conhece. Vive nos subúrbios da cidade. É guarda-nocturno de uma fábrica.
Sonhos: Ver mais longe. Cantar.

Chat Vida Frágil II

Ouvidor: - O teu pai? E tu?

Vida Frágil: - Estou dispersa, sem vontade de trabalhar. O meu pai está pirado. Anda a mudar tudo, está numa fase em que só está bem a mudar as coisas lá em casa. De um dia para o outro mudou de rede telefónica duas vezes. Mudou para Tele 2, agora mudou para a Optimos Home - mudou de TV Cabo para Antena Parabólica. Enfim, troca uns serviços por outros e também não lhe apetece trabalhar. Anda todo lixado, irritado, sempre a discutir com a minha mãe, a dizer coisas como: - morre para aí! Tem um tumor no fígado, ainda não sabemos o que é. São comportamentos estranhos. Ontem estive com eles ao jantar e eles estão completamente alterados.

E O TEU IRMÃO?

Vida Frágil: - O meu irmão não é pessoa de promover diálogos, remete-se ao silêncio, diz que não fala com nenhum deles pois assim, não falando, eles não discutem. Está chateado com o meu pai porque ao deitar a TV Cabo abaixo, deixou-o sem Netcabo e nem sequer falou com ele.


- Pk achas q ando toda down?


Não vivendo com os meus pais, a minha tarefa é mais árdua porque ando sempre de um lado para o outro a fazer os possíveis para estar com eles, para os apanhar a jeito para conversar, para os por a falar um com o outro sem ser a discutir. Entro em casa dos meus pais e é:

- Mãe! Não fales assim para o pai! Pai! Não respondas assim para a mãe! Bruno! Não fales assim para os pais! Pai! Não digas isso ao Bruno!
Há dias em que rebento! Numa sexta qualquer, eram para aí onze da noite, saí de casa dos meus pais tão lixada...Cheguei a casa, peguei numa mochila, meti umas roupas e saí porta fora até à Estação! Queria apanhar um comboio qualquer, para qualquer parte.


DOIS

Vida Frágil: - O Hugo…Ás vezes ‘tamos muito bem, outras muito mal. Não é uma relação que me dê a estabilidade que eu neste momento precisava. É muito parecido comigo. Muito temperamental.
O Pedro vejo-o quase todas as semanas, sinto saudades de estar com ele. Esquisito, não? Há duas semanas, num domingo, estava em casa, completamente em pânico, tinha um texto para entregar na segunda, não tinha uma única linha escrita. Telefonei-lhe, fomos tomar café. Eram cinco da tarde, falamos...Eu disse que não conseguia escrever. Ele lembrou-me que era uma boa "escritora", cheguei a casa e até ás oito horas já tinha metade da reportagem pronta. Depois veio-me buscar para jantar. Eram duas da manhã e ‘tava tudo feito. Fiz em poucas horas o que andei semanas a adiar. O Pedro é assim. Transmite-me confiança, põe-me a trabalhar quando estou bloqueada, conhece bem as minhas fraquezas e a minha força. São onze anos.
O Hugo...bom...chegou a minha casa nessa noite às duas da manhã, depois de eu ter terminado o texto, vinha com um filme passado em Amesterdão…

quinta-feira, abril 06, 2006

Chat Vida Frágil

De repente, a uma hora incerta da manhã, no ecrã de um computador qualquer, em qualquer canto da aldeia, uma mensagem abrupta.


Personagens: Vida Frágil e Ouvidor

É a vida, frágil como só ela é! :


- Ontem, um segundo tio meu, caiu das escadas ao levar o lixo e ficou em coma.
A vida é do carago, uma coisa básica, tipo ires por o teu lixinho no contentor, escorregas da escada e...tau! Cuidados intensivos.

E NÃO É ISSO QUE É BOM?

- Não. É demasiada imprevisibilidade para o meu gosto.Nunca tive esta consciência da "fragilidade " da vida e isso está a dar cabo de mim.


"Se o orvalho de Adashino nunca secasse, se o fumo em Toribeyana nunca se dissipasse, então os homens não sentiriam pena das coisas. Na verdade, a beleza da vida é a sua incerteza."

Yoshida Kenko, Monge budista japonês

É a vida, frágil como só ela é!:

- É incrível. Estou com a minha mãe ao telefone...Morreu uma prima dela e ela está em pânico. Tudo acontece à minha família. Parece "karma". É tudo contra mim. Quando estou a conseguir que a minha mãe pense que não vai morrer...Tau! Morre alguém de quem ela gosta, com um cancro. Parece mesmo que anda alguém a conspirar contra mim.

E A TUA MÃE?

É a vida, frágil como só ela é!:

- Vai fazer exames para saber que tipo de "massa" se está outra vez a desenvolver no intestino, mas os médicos dizem-me que ainda não sabem bem o que é. Mas eu sei que pode ser uma metástase, os doentes que desenvolvem cancro no cólon têm 50% de probabilidades de desenvolver novos cancros que, se tratados com quimioterapia e anticorpos, podem ser controlados, mas a esperança média de vida do doente é de dois anos, apenas. O cancro é uma doença fascinante: Quando as células se tornam malignas o seu crescimento é igual ao das células normais, mas, e isso é que é interessante, à medida que a massa do tumor aumenta, o ritmo de crescimento das células diminui. Por isso é que pessoas com cancro em estado muito avançado, andam como se nada fosse. Ou seja: as células param de se desenvolver quando a massa do tumor se torna letal. É como se pensassem: "ok, este fulano já vai c'u carago, bora lá deixar de trabalhar!"

Progressivamente o cancro tornou-se o meu único objecto de estudo. Comprei um Manual de Medicina, do Harrison. Sei que alimentos ajudam a prevenir o cancro: Alho e malagueta são altamente anti-cancerígenos. Ponho alho e malagueta em toda a comida que faço.


segunda-feira, março 27, 2006

Decadência

Estou triste. Por entre prédios em ruínas, casas que a qualquer momento ameaçam derrocada, passam os loucos. Em dias de verão vestem pantufas, cachecóis coloridos, camisolas de clubes de futebol. Desgrenhados, não cortam o cabelo, não desfazem a barba.

Estou triste. Neste país esquisito, só eles cantam, só eles riem. Só eles saem por aí, sem fato, sem gravata, à gargalhada. São os loucos. Não sabem rezar, mas não estão tristes.

sexta-feira, fevereiro 17, 2006

Medo

No anos setenta do século passado, trovoava violentamente sobre a Vila. Era no quarto da mãe. O vento rugia. As faíscas iluminavam o mundo em frente da janela cinzenta. Mas tudo eram sombras na ausência dos pais. Por isso choravam, abraçados.

Formas

Formas horizontais no banco, junto ao rio. A terra protege a essência vertical das árvores. A forma é a substância. É inalterável. Apenas a substância que a forma oculta. Assim também a vida organizada dos humanos. Tu: a substância. Provavelmente.

Amantes

Escondem-se enrolados no corpo da árvore. Em volta, o sol não esclarece as sombras. Assim procuram a fuga. O esconderijo.

15.02.2006

quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Mong Há





Mong Há

Alto da colina
um pássaro de vento
em silêncio, a cantar.










Árvore do Pagode
(Flora Microcarpa)

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Fevereiro

Depois de cortados, arrumava os ramos na aramagem e atava-os com fitas. Oiço as laminas da tesoura e vejo a escada de madeira apoiada na parede, o escadote. Duas tardes chegavam. Eu varria os pedaços caídos. Preparava-se o vinho, podando a vinha.
Serpentinas de várias cores, pistolas de água. Máscaras. Roupa velha, lenha queimada. Fogueiras. Bailes da juventude. O frio, o sol e a neve. A comida gorda, as orelhas de um porco antes das cinzas. A família à volta da mesa uma vez mais. O cheiro da terra. Carnaval e pirilampos. Rates, o senhor Rates, pequeno gorducho de manguitos, vendendo rabichas, estalidos, peidos-engarrafados que os malandros lançavam na sala de aula longe do olhar do contínuo, antes de tocar para dentro.

segunda-feira, janeiro 30, 2006

Buraco Negro. Mensagem a um amigo

Neblina

Neblina sobre a lua, sobre o céu agora azul-escuro de um lado, vermelho junto ao mar e às nuvens. Os animais recolhem a casa. A noite é discreta.

A ausência de luz transforma os lugares em esconderijos do amor e do crime.

Seta em Teerão

Um quarto de hotel. Uma seta desenhada na parede, um Al-Corão numa gaveta e um tapete. A seta apontada. Do coração à cabeça.

Orientação. Meca.

17.01.2006

O ERRO

O Erro não se corrige, não pede desculpa. O Erro não se assume como um erro, não se reconhece. Um erro assim pode acabar o seu tempo, podre e gasto, doente e louco, numa cadeira de rodas. Eis-nos perante o pior dos erros: o que, agindo deste modo, se desmente, negando-se a si próprio até confundir-se com o Mal.
Não é o único Erro da História. Vejo-o muitas vezes na televisão e nos jornais: Este chama-se Pinochet.

O Mal é o Erro em si mesmo.

Erro II

Haverá álibis para um Erro? A Torre de Babel? Apenas a Torre?

A seca














Deixaram-me um país seco. Não me resigno. A não resignação é a escrita. A voz. Se estás de acordo, substituo o pronome e digo:

- Deixaram-nos um país seco. Seco de quase tudo.

Há, por vezes, mais e melhores ideias no deserto. Segredos húmidos. Segredos férteis. Seres vivos. Oásis. Miragens.

sexta-feira, janeiro 27, 2006

Instantes

A lua cheia, branca no céu azul límpido. A lua em linha recta com o sol, no Inverno da tarde que anoitece. Um barco alheio ao movimento dos astros, na faina do entardecer. Uma luz laranja, finíssima, em voos dispersos de pássaros e de gaivotas.
Um comboio pesado de ferro e de gente irritada regressa aos agora-esconderijos, outrora-casas. Um silêncio de árvores, de ramos de choupos, sem vento, frios. Navios de leveza vogam para lugar nenhum, distantes. Pela janela olho a lua luminosa e penso na ignorância de não absorver coisas assim. Um melro anónimo poisado num galho de choupo abandoná-lo-á em breve, despercebido.

Outro comboio passa, feroz.

Pergunto-me: O que é o equilíbrio?

No horizonte, as nuvens escondem o sol, parecem montanhas no mar, junto de pequenos barcos de pesca e de outras nuvens, rubras da luz final. Há uma ordem natural na oposição de tudo. É o contrário, o Caos? A ausência do Nada e do Vazio que une a lua ao sol, a luz à escuridão, o silêncio ao vento, as nuvens ao céu e à agua, o que é imenso ao ínfimo e o perto ao longínquo?

O melro deixou o galho e a árvore e tudo isto é estranho a um diário, a um telejornal.

Porquê?

Inverno

Na margem, junto ao rio, sobre a relva, o passeio das gaivotas. No Inverno a noite vem mais cedo, protectora. Retiramo-nos para o lugar da calma, ao sabor da lenha queimada. As árvores, sem folhas, recuperam a seiva. Preparam a chegada da maturidade. A vinda do pensamento.

Parecem Homens.

segunda-feira, janeiro 23, 2006

Janeiro





Novos agasalhos ao primeiro dia. Havia o frio imenso, como a neve. O gelo dos caminhos e até o pó. As pedras, as tangerinas. Uvas e vinho. Amarei sempre esta viagem e as conversas, as gargalhadas perdidas que encontro reunidas na mata, ao fim da primeira tarde de Janeiro.