segunda-feira, abril 10, 2006

Desabafo

Tenho sede de férias. Se fosse possível ia para qualquer lado, até para a Conchinchina! Estou cansada, farta de tomar cenas para dormir. Chás, Valdisperte’s…Deixei de tomar café e não durmo. Há uma semana que ando a dormir três a quatro horas por noite e estou cansada. Ontem o meu irmão foi com o meu pai para as urgências, nem me chamaram. Só me disseram hoje de manhã.
Ele está bastante constipado e não pode tomar certas medicações por causa do fígado. É gripe. Foi muito abaixo. Depois trabalha por turnos à noite, apanha frio, não é grave mas agora está de baixa. Eu é que já não consigo separar o grave do menos grave. Acordei às oito horas com a minha mãe a dizer o que se tinha passado e fiquei fula por ninguém me ter dito nada. Devia ter ido lá jantar, mas não fui para estar com o Hugo. Também não valeu de nada. Zangámo-nos. Ando a perder o meu tempo com ele. Sinto-me mais frágil. Choro com mais facilidade e ele fica todo stressado com isso. Diz que não sabe o que fazer e não percebe que não tem de fazer nada. Só tem de me deixar chorar à vontade e ponto final. Ontem tive de pôr as coisas no plano do tudo ou nada, porque não há hipótese: ou ele aguenta que eu esteja com uma depressão e chore, seja em que circunstâncias for, ou porque passa uma música no rádio que me toca, ou porque me cai uma cagadela de pomba no casaco, ou então se não aguenta eu vou embora, porque ele cansa-me, as perguntas dele cansam-me, o ele querer fazer com que eu não0 esteja assim triste só me entristece ainda mais. O problema disto tudo é que eu tenho de trabalhar e ando com uma cara péssima, tenho de fazer telefonemas e como passo a vida fugir para ir chorar à casa de banho fico com a voz "presa". Depois vou à minha psicóloga e ela diz-me que eu estou no bom caminho para lidar com a depressão só porque me vê bem vestida e arranjada, porque, segundo ela, se eu estivesse mesmo mal não tinha vontade de me arranjar. Bolas! Claro que ando bem vestida, ao dinheiro que ando a gastar em roupa!!! Só estou bem dentro do shopping. Era o que mais faltava! Se para além de andar triste ainda andasse desmazelada! Tenho 28 anos. Sou bonita, tenho de andar bem vestida.

sexta-feira, abril 07, 2006

Harmonica e os Arruma Carros

O Harmonica que é Charles Bronson no Western Épico de Sergio Leone, "Once Upon a Time in The West" (1968), poderia encarnar. Apareceria em silêncio, saindo do nada tórrido do deserto, tocando a harmonica de Ennio Morricone pelas ruas secas, arenosas das cidades portuguesas, onde há jovens desgraçados, drogados, despedaçados, despenteados, mal-cheirosos, acenando em orquestra, para os lugares vazios de quem procura estacionamento.
Uma extorsão voluntária que as autoridades permitem. É inaceitável há mais de uma década!

O Harmonica faz falta na realidade deste "west".

Sonho

Agosto, 1993


Estudantes timorenses, numa acção que outros repetiram em datas anteriores, invadem e refugiam-se na embaixada holandesa em Jacarta. Dois deles: Abraão, cabelo comprido, magro moreno. Guerrilheiro aos nove anos nas montanhas de Loro Sae. Hélder, cabelo curto, óculos redondos, mais baixo e mais gordo. Comunista crítico de Suharto. Dias mais tarde, um avião da Cruz Vermelha transporta-os para Amesterdão, de onde saem rumo a Portugal. Ingressam na Universidade. Cursos: Sociologia e Administração Pública.
"É preciso ver mais longe", dizia Hélder; "...e cantar, cantar..." acrescentava Abraão, segurando a viola.
Abril, 2006
Abraão passeia de cabelos longos e brancos numa rua anónima, escura. Trabalha no norte da Europa, num aviário. Hélder, passa e não me conhece. Vive nos subúrbios da cidade. É guarda-nocturno de uma fábrica.
Sonhos: Ver mais longe. Cantar.

Chat Vida Frágil II

Ouvidor: - O teu pai? E tu?

Vida Frágil: - Estou dispersa, sem vontade de trabalhar. O meu pai está pirado. Anda a mudar tudo, está numa fase em que só está bem a mudar as coisas lá em casa. De um dia para o outro mudou de rede telefónica duas vezes. Mudou para Tele 2, agora mudou para a Optimos Home - mudou de TV Cabo para Antena Parabólica. Enfim, troca uns serviços por outros e também não lhe apetece trabalhar. Anda todo lixado, irritado, sempre a discutir com a minha mãe, a dizer coisas como: - morre para aí! Tem um tumor no fígado, ainda não sabemos o que é. São comportamentos estranhos. Ontem estive com eles ao jantar e eles estão completamente alterados.

E O TEU IRMÃO?

Vida Frágil: - O meu irmão não é pessoa de promover diálogos, remete-se ao silêncio, diz que não fala com nenhum deles pois assim, não falando, eles não discutem. Está chateado com o meu pai porque ao deitar a TV Cabo abaixo, deixou-o sem Netcabo e nem sequer falou com ele.


- Pk achas q ando toda down?


Não vivendo com os meus pais, a minha tarefa é mais árdua porque ando sempre de um lado para o outro a fazer os possíveis para estar com eles, para os apanhar a jeito para conversar, para os por a falar um com o outro sem ser a discutir. Entro em casa dos meus pais e é:

- Mãe! Não fales assim para o pai! Pai! Não respondas assim para a mãe! Bruno! Não fales assim para os pais! Pai! Não digas isso ao Bruno!
Há dias em que rebento! Numa sexta qualquer, eram para aí onze da noite, saí de casa dos meus pais tão lixada...Cheguei a casa, peguei numa mochila, meti umas roupas e saí porta fora até à Estação! Queria apanhar um comboio qualquer, para qualquer parte.


DOIS

Vida Frágil: - O Hugo…Ás vezes ‘tamos muito bem, outras muito mal. Não é uma relação que me dê a estabilidade que eu neste momento precisava. É muito parecido comigo. Muito temperamental.
O Pedro vejo-o quase todas as semanas, sinto saudades de estar com ele. Esquisito, não? Há duas semanas, num domingo, estava em casa, completamente em pânico, tinha um texto para entregar na segunda, não tinha uma única linha escrita. Telefonei-lhe, fomos tomar café. Eram cinco da tarde, falamos...Eu disse que não conseguia escrever. Ele lembrou-me que era uma boa "escritora", cheguei a casa e até ás oito horas já tinha metade da reportagem pronta. Depois veio-me buscar para jantar. Eram duas da manhã e ‘tava tudo feito. Fiz em poucas horas o que andei semanas a adiar. O Pedro é assim. Transmite-me confiança, põe-me a trabalhar quando estou bloqueada, conhece bem as minhas fraquezas e a minha força. São onze anos.
O Hugo...bom...chegou a minha casa nessa noite às duas da manhã, depois de eu ter terminado o texto, vinha com um filme passado em Amesterdão…

quinta-feira, abril 06, 2006

Chat Vida Frágil

De repente, a uma hora incerta da manhã, no ecrã de um computador qualquer, em qualquer canto da aldeia, uma mensagem abrupta.


Personagens: Vida Frágil e Ouvidor

É a vida, frágil como só ela é! :


- Ontem, um segundo tio meu, caiu das escadas ao levar o lixo e ficou em coma.
A vida é do carago, uma coisa básica, tipo ires por o teu lixinho no contentor, escorregas da escada e...tau! Cuidados intensivos.

E NÃO É ISSO QUE É BOM?

- Não. É demasiada imprevisibilidade para o meu gosto.Nunca tive esta consciência da "fragilidade " da vida e isso está a dar cabo de mim.


"Se o orvalho de Adashino nunca secasse, se o fumo em Toribeyana nunca se dissipasse, então os homens não sentiriam pena das coisas. Na verdade, a beleza da vida é a sua incerteza."

Yoshida Kenko, Monge budista japonês

É a vida, frágil como só ela é!:

- É incrível. Estou com a minha mãe ao telefone...Morreu uma prima dela e ela está em pânico. Tudo acontece à minha família. Parece "karma". É tudo contra mim. Quando estou a conseguir que a minha mãe pense que não vai morrer...Tau! Morre alguém de quem ela gosta, com um cancro. Parece mesmo que anda alguém a conspirar contra mim.

E A TUA MÃE?

É a vida, frágil como só ela é!:

- Vai fazer exames para saber que tipo de "massa" se está outra vez a desenvolver no intestino, mas os médicos dizem-me que ainda não sabem bem o que é. Mas eu sei que pode ser uma metástase, os doentes que desenvolvem cancro no cólon têm 50% de probabilidades de desenvolver novos cancros que, se tratados com quimioterapia e anticorpos, podem ser controlados, mas a esperança média de vida do doente é de dois anos, apenas. O cancro é uma doença fascinante: Quando as células se tornam malignas o seu crescimento é igual ao das células normais, mas, e isso é que é interessante, à medida que a massa do tumor aumenta, o ritmo de crescimento das células diminui. Por isso é que pessoas com cancro em estado muito avançado, andam como se nada fosse. Ou seja: as células param de se desenvolver quando a massa do tumor se torna letal. É como se pensassem: "ok, este fulano já vai c'u carago, bora lá deixar de trabalhar!"

Progressivamente o cancro tornou-se o meu único objecto de estudo. Comprei um Manual de Medicina, do Harrison. Sei que alimentos ajudam a prevenir o cancro: Alho e malagueta são altamente anti-cancerígenos. Ponho alho e malagueta em toda a comida que faço.